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Crônica do Dia - identidade negra - Rede Luziânia

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Crônica do Dia – identidade negra

Quando passo pelas ruas centenárias de Luziânia, pela icônica Rua do Rosário com seus resistentes casarios, minha mente remete aos tempos de outrora, dos dias que foram executadas as obras das casas. pensar neste período me remete aos tempos em que gente era mera mercadoria. Na antiga Santa Luzia, nas lavras de ouro, casas e fazendas, Joseph de Melo Alvares, relata as centenas de escravizados que eram relatados como mercadoria a se possuir. Quem você acha que construiu todas as belas casas que resistem ao tempo e que ainda hoje, algumas estão de pé? Foi mão de obra negra. Luziânia foi forjada por mão de obra negra. Cada casa, cada rua aberta, cada obra, foi e ainda é obra de mãos e braços de mulheres e homens, crianças e idosos negros.

Mário Roberto Ferraro (2016), relata em seu artigo, que de 1881 a 1895, que havia a Colônia Blasiana, entendida como um espaço de produção de conhecimentos científicos em assuntos ligados à agricultura, que se localizava em Santa Luzia, atual Luziânia, Goiás, no Planalto Central brasileiro, no entorno do Distrito Federal. A instituição de ensino havia sido criada para acolher crianças negras órfãs, beneficiadas pela lei do Ventre Livre. Pesquisas da agricultura imperial foram implementadas, dando uma nova moldagem à maneira de instruir as crianças negras, filhas e filhos de escravizados. A natureza do trabalho ainda era braçal, conforme relata o artigo, mas ao menos havia algum interesse na instrução escolar, negada aos antepassados escravizados.

Gelmires Reis, escritor e grande historiador de Luziânia, relata em seus escritos que Santa Luzia, hoje Luziânia, possuía uma população de escravizados que chegava a quase 20 mil pessoas. Com a assinatura da Lei Áurea em 1888, uma boa parte destes escravizados, agora na condição de pessoas livres, se mudaram para a região do Mesquita. Hoje este é o Quilombo, localizado na Cidade Ocidental, ainda hoje preserva raízes daqueles primeiros habitantes de Luziânia. Naquela comunidade continuaram sendo trabalhadores rurais, servindo nas plantações de marmelo e produzindo a mais famosa iguaria, cantada e contada até mesmo no hino de Luziânia, a marmelada, sobremesa apreciada até mesmo por Dom Pedro II. Na exposição Universal da Filadélfia – a Centennial Exhibition, que celebraria o Centenário da assinatura da Declaração de Independência que foi inaugurada em 10 maio e se estendeu até 10 novembro de 1876. Dom Pedro II teria levado caixas da marmelada de Santa Luzia para o evento.

Apesar de ser tão celebrada nossa marmelada, aos negros que realmente puseram a mão na massa, restam as bordoadas. Praticamente inexiste a relação entre os escravizados e a confecção do doce tradicional. Isso é tão somente um exemplo de como existe um desinteresse pelas pessoas escravizadas que forjaram Luziânia. Faz falta um monumento. Faz falta homenagens. Faz falta representatividade. Faz falta políticas afirmativas para as pessoas pretas. Luziânia está a poucos dias de completar 277 anos. A identidade negra aparece pouco ou quase nada no registro histórico da cidade. Mesmo assim ela é inegável e indelével. As pessoas manterão viva este legado e o reconhecimento virá no tempo certo e nada nem ninguém impedirá.

Arley da Cruz – 20.11.2023

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